Deboche, debochado: (devassidão, libertinagem) significado
O deboche consiste nos excessos e abusos dos prazeres permitidos, ou ilícitos. Devemos fugir desse vício com tanto mais cuidado quanto ele arrasta atrás de si o arrependimento, as mágoas e as doenças do corpo.
Um homem mergulhado no deboche, levando uma vida tão contrária à natureza, tratará os outros como homens, quanto trata a si mesmo como animal? De ordinário, aqueles que nada se recusam, recusam tudo aos outros. Essas pessoas que medem toda sua felicidade pelos prazeres grosseiros do corpo, não têm o sentimento bastante delicado para querer a felicidade dos outros. A compaixão é uma virtude; a boa fortuna nada ensina, e as próprias volúpias que ela proporciona, as delicadezas, as facilidades da vida que tornam a alma tão mole, tornam o coração duro e cruel.
O deboche não tem fundo; e como os voluptuosos são sempre pródigos para si mesmos, jamais permitem o que favoreça a liberalidade dos outros. Não há vício que o deboche não arraste com ele. Ele sacrifica tudo aos seus pendores, e quando não pode satisfazê-los, recorre ao crime, por pouco que acredite que o crime possa proporcionar-lhe o de que precisa.
Quando um homem cai de um montanha bem alta, na queda ele vai espalhando partes de suas roupas e de seus membros; o chapéu num lugar, no outro seu manto; ali um braço, lá uma parte da cabeça; enfim, noutro lugar a vida. A mesma coisa ocorre quando começamos a escorregar no declive do vício. Vamos rolando de desgraça em desgraça, deixando em cada lugar uma parte de nós mesmos; em um o dinheiro, no outro a honra; aqui a saúde, lá os parentes, os amigos, a liberdade; enfim, quando nos percebemos no chão, nos sentimos como que sepultados no fundo de uma prisão. Mas é então que, voltando pouco a pouco à razão, sente-se todo o horror da devassidão e do deboche; reconhece-se que tudo o que a riqueza havia causado de males, a pobreza havia convertido em bens; a riqueza havia inspirado a loucura; a pobreza nos trabalha para nos dar a sabedoria, que outrora nos era incompreensível. É a sabedoria que esclarece e afirma a razão, que proporciona a saúde do corpo e da alma.
Os prazeres do amor não foram feitos para os amantes debochados: eles não têm nem delicadeza, nem julgamento; são todo corpo e, por conseguinte, não podem saborear os verdadeiros prazeres. Amor, quão poucos sentem o valor de tuas bondades! Quão poucos conhecem a verdadeira volúpia! Aqueles que são escravos dos sentidos grosseiros, aqueles para quem as qualidades do coração nada valem, são indignos do lugar de teus eleitos e de teus deleites. Quanto mais eles te sacrificam, mais sujam teus altares e profanam teu templo. (…)
Hoje em dia os costumes estão de tal modo corrompidos, que se sente menos vergonha por parecer debochado do que parecer amoroso. Foi banido o sentimento que chamamos a boa companhia; é de bom tom exibir sua libertinagem, e muito mal demonstrar um pendor estimável. Deixa-se a esposa por uma atriz; as mulheres preferem atores, ou homens adornados, a seus maridos. Em verdade, sou tentado a crer que as letras e as artes, longe de contribuirem para depurar os costumes, não se apegam senão a corrompê-los, e que o século mais esclarecido é o século do deboche, da libertinagem.
(Do termo "Débauche", do Dictionnaire des passions, des vertus et des vices, T. 1. Traduzido do francês pela equipe do GEAK / IPEAK).